Fiona Apple canta "I want you" de Elvis Costello, do álbum "Blood and Chocolate". A versão de Apple, acompanhada pelo próprio Costello (que também se aventura, embora não tão eficazmente, numa versão de uma música de Apple), só não é maior do que o original porque, convenhamos, é algo de sacrílego dizer que um original é superável e, especialmente, aquele original. Se a versão de "Across the universe" fica claramente aquém do original dos Beatles, mesmo com o belíssimo video do Paul Thomas Anderson, esta versão de "I want you" poderia ser, pelo contrário, a razão primeira e última para se gostar de "covers". Ou não fosse um conto de amor feito obsessão, uma narrativa de descontrolo, e no limite, de fúria assassina. No fundo, a especialidade de Fiona Apple. Em menos palavras: a canção catarse. É a própria que se explica/desculpa com a função terapêutica das suas composições. Os protagonistas das músicas de Fiona Apple, quase sempre masculinos, são demónios cujo exorcismo é um imperativo (cfr. Get gone, "when the pawn..."; "Tymps" e "Oh well" ambos de "Extraordinary Machine", onde o diálogo cantado com a "memória" se faz de avanços compreensivos e recuos rancorosos, que raiam a patologia tal como em I want you, em cuja primeira parte ela agoniza num sussurro, para depois seguir em crescendo até ao estertor emocional final). À semelhança de I want you, boa parte das músicas de Apple convocam demónios adorados que ora se apaziguam, ora se põem à distância, ora se esquecem, ora se matam. Talvez por isso a canção lhe assente tão bem. No fim, parece estar a sair de uma espécie de transe. E quem a ouve também.
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